Compras Públicas Sustentáveis: acelerar a transição ecológica com a CO₂ Performance Ladder em Portugal
por Margarida Natal Mendes, Head of Sustainability Department da Aliados Consulting
A contratação pública tornou-se um dos instrumentos mais determinantes para alcançar as metas climáticas europeias. A União Europeia, ao iniciar a reforma das diretivas de contratação pública, reconheceu formalmente que os mecanismos atuais precisam de ser mais simples, mais flexíveis e, sobretudo, capazes de integrar sustentabilidade de forma consistente.
O recente Policy Brief do IISD – Simpler and More Sustainable Procurement – sintetiza o desafio: cerca de 11% das emissões totais da União resultam diretamente de decisões de procurement, e é precisamente aqui que reside uma das maiores oportunidades de transformação . Portugal, através da Estratégia Nacional de Compras Públicas Ecológicas – Eco360 – está alinhado com esta evolução, ao estabelecer que critérios ambientais robustos devem tornar-se prática comum em todos os contratos públicos.
Neste cenário, a CO₂ Performance Ladder (CO₂PL) assume um papel distintivo. Criada para estruturar a redução de emissões nas organizações, nos seus projetos e nas cadeias de valor, é simultaneamente um sistema de gestão de CO₂ e uma metodologia aplicável de forma transparente na adjudicação pública. O Manual descreve-a como uma ferramenta que promove “uma redução substancial de CO₂”, estimulando inovação sem impor soluções rígidas e garantindo rigor metodológico através de requisitos claros em matéria de conhecimento, redução, transparência e participação . Esta combinação – rigor técnico aliado à flexibilidade – tornou a Ladder um dos instrumentos mais utilizados nos Países Baixos e um exemplo estudado noutros países europeus.
A discussão europeia sobre GPP (Green Public Procurement) evidencia desafios significativos: falta de capacidade técnica nos compradores públicos, receio de riscos jurídicos, carga administrativa elevada e dificuldade em verificar alegações ambientais. O IISD salienta que a solução passa por ferramentas robustas e verificadas por terceiros, que reduzam a fragmentação e permitam comparabilidade real entre propostas . É exatamente esse espaço que a CO₂PL ocupa. Na contratação pública, a Ladder pode ser integrada como critério PEMV (proposta economicamente mais vantajosa), atribuindo um desconto fictício ao preço (ou atribuindo uma percentagem ou pontos) à medida que o concorrente apresenta níveis superiores de gestão de carbono – uma prática juridicamente estável, plenamente alinhada com as diretivas europeias e regulamentada no Guia de Contratação Pública da CO₂PL . Esta mecânica incentiva o mercado a ir além de compromissos teóricos e a apresentar provas verificadas e auditadas por organismos acreditados.
A metodologia responde, assim, a desafios identificados tanto na ECO360 como no debate europeu: a necessidade de critérios verificáveis, a importância da transparência e o reconhecimento do custo total do ciclo de vida. Com a obrigatoriedade do dossier de projeto, presente na norma, cada projeto adjudicado com vantagem da Ladder deve documentar planeamento, medidas e resultados efetivos de redução de CO₂, aumentando a confiança dos compradores públicos e promovendo execução contratual com impacto tangível . Esta característica é particularmente relevante para setores como construção, energia ou transportes, responsáveis por grande parte da pegada de carbono das compras públicas – áreas destacadas tanto pelo IISD como pela estratégia portuguesa.
A convergência entre estes três pilares – o enquadramento europeu, a ECO360 e a robustez técnica da CO₂PL – permite afirmar que Portugal tem condições singulares para transformar a contratação pública num motor de inovação climática. A Ladder oferece às entidades adjudicantes uma forma simples e juridicamente segura de operacionalizar sustentabilidade, evitando o risco de greenwashing, reduzindo a fragmentação de critérios e promovendo concorrência leal entre fornecedores. Simultaneamente, ajuda organizações a estruturar o seu percurso de descarbonização, medindo e reduzindo as suas emissões de forma contínua, transparente e auditada.
Num momento em que a União Europeia reforça que a contratação pública deve ser simultaneamente mais simples e mais sustentável, e em que Portugal dá passos decisivos com a ECO360, a adoção sistemática da CO₂ Performance Ladder pode acelerar a transformação do mercado nacional. Como coordenadora da implementação da Ladder em Portugal, vejo diariamente o potencial desta metodologia para gerar impacto real: transparência, redução efetiva de emissões, inovação na cadeia de valor e maior maturidade das organizações nas suas estratégias climáticas. O futuro da contratação pública sustentável exige ferramentas credíveis, comparáveis e verificadas – e é precisamente isso que a CO₂ Performance Ladder oferece.